Bandidos de Toga


Sempre fui intimamente contra reserva de vagas para negros, deficientes ou qualquer outra minoria que, na opinião do legislador, necessitasse de uma proteção especial em relação ao outro. Não me convence a tese de que alguns, para terem as mesmas oportunidades que os outros, precisam ter um sistema privilegiado de acesso. Sempre rebati os argumentos de que os supostamente excluídos socialmente deveriam ter compensados os anos de discriminação com acesso mais facilitado a melhores vagas nas universidades ou empregos públicos com a constatação de que isso traria duas consequências funestas: 1º) não resolveria o problema principal, que é a melhoria do ensino público, porque se fosse a educação de qualidade, brancos, negros, pobres e ricos teriam acesso idêntico à educação de qualidade, e isso equilibraria toda a diferença anterior; 2º) seria ainda mais prejudicial àquele que, de origem branca, teve o azar de nascer na periferia e ser pobre.
Por isso que a declaração da Juíza Eliana Calmon, baiana de nascimento e brasileira de coração, ministra vitalícia do Superior Tribunal de Justiça e membro honorário do Conselho Nacional de Justiça deve ser amplamente comemorada. É que ela não chegou onde está pela cor de sua pele, ou por ser mulher, ou por qualquer outro motivo que não seja sua competência.  E isso deve ser reforçado porque assim é que as coisas deveriam ser, pois não basta ser mulher, pessoa com necessidades especiais ou negro para merecer lugar de destaque entre os demais. Canalhas envelhecem, e nem por isso deixam de ser nocivos à sociedade. Mas não se pode “tapar o sol com a peneira” e imaginar que existe uma classe de brasileiros que estão acima dos demais. Aliás, nossa própria Constituição lembra: “todos somos iguais perante a lei”.  Daí a importância na lembrança de que existem bandidos que se escondem atrás da toga, assim os que se escondem atrás da farda, do mandato etc. Em outras palavras, e isso não deveria causar nenhum espanto, disse a ministra que existem maus juízes e bons juízes. Da mesma forma que existem maus advogados e bons advogados, bons médicos e maus médicos, bons engenheiros e maus engenheiros. Porque não é comum, por exemplo, um engenheiro deputado projetar e construir um edifício que desmorone porque há areia em demasia no concreto, ou que médicos admoestem suas pacientes, tampouco que advogados se prestem a cometer ilícitos no aparente exercício de suas atribuições. É que, ainda que existam juízes que vendam sentenças e percam o cargo de presidente de tribunal, por exemplo, essa conduta está longe de se a regra. Em outras palavras, disse à ministra que em todas as carreiras, e nisso não há exceção, existem maus e bons profissionais, e não é justo que o bom profissional, aquele que ama e se dedica ao exercício de sua atividade profissional, suporte o ônus decorrente do mau exercício daquela minoria que, infelizmente, existe em todas as atividades.
Assim, a declaração da Ministra merece todos os elogios. E ela está onde está porque foi uma excelente juíza. E diferente de muitos outros colegas do STJ, chegou àquele Tribunal pela porta da frente: foi procuradora e juíza, sempre por concurso, e depois desembargadora. E desde 1999 é ministra no STJ: e se ela disse que há bandidos de toga, é melhor não duvidar...

Vladimir Polízio Júnior, 40 anos, é defensor público (vladimirpolizio@gmail.com

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