Os Vagabundos e a Justiça
Em palestra para juízes federais
em São Paulo, na manhã do último dia 02, a ministra Eliana Calmon, corregedora
do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), disse que os juízes “decentes” do Brasil
não podem ser confundidos com a “meia dúzia de vagabundos” que prejudica a
magistratura nacional. De fato, mais uma vez a ministra, que já foi alvo de
severas críticas de diversas associações de juízes, como a própria AMB
(Associação dos Magistrados do Brasil), por defender a autonomia do CNJ para
punir os “bandidos de toga”, acertou. E quem seriam esses “vagabundos”? A falta
da identificação precisa é ruim, porque se pode confundir quem é quem.
Recentemente o presidente da AMB,
Nelson Cassandra, foi entrevistado pelo programa Roda Viva, da TV Cultura, e
defendeu férias de dois meses ao ano para todo trabalhador brasileiro, tal qual
a magistratura. Aduzindo que “lazer é importante”, e que “a vida não é só
trabalho”, propagou o magistrado que “o que queremos é estender esse benefício
a todos”. Asseverou também, na mesma oportunidade que a decisão do STF (Supremo
Tribunal Federal) que permitiu ao CNJ investigar juízes foi uma vitória “da
AMB”. Bem, na verdade, a AMB sempre se postou contra a atuação do CNJ na
investigação de magistrados, e nos debates no STF foi forte apoiadora de
restrições ao trabalho investigativo daquele Conselho. E sobre os dois meses de
férias para todos os trabalhadores, bem, de fato, lazer é importante. Mas para
a grande maioria de brasileiros, que não ganha salários de R$ 20 mil por mês,
como os juízes, antes das férias de 60 dias que venha a melhoria da qualidade
de vida, que passa necessariamente pelo SUS, pela segurança pública, pela casa
própria etc.
Nos dias atuais, e com as eleições
de outubro se aproximando, é preciso confrontar o discurso com as atuações,
tamanha a possibilidade do antagonismo. A entrevista do presidente da AMB é
apenas um exemplo. Na defesa do indefensável, do imoral, ainda que legal, os
argumentos podem emprestar uma aparência plausível ao que não se sustenta. Vagabundos
não são exclusividade da magistratura, evidente, e ainda estão em todos os
poderes, distorcendo, confundindo, iludindo. Talvez, para a moralidade do
Judiciário, os mesmos requisitos exigidos nos concursos para o ingresso na
carreira, como reputação e conduta ilibadas, devessem ser reiterados depois de
anos de toga. Afinal, um juiz deve ser sempre “ficha limpa”.
Vladimir Polízio Júnior, 41 anos,
é defensor público (vladimirpolizio@gmail.com)
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