TRIBUTOS E FATURAS EM TEMPOS DE COVID-19
Uma das poucas unanimidades em tempos
da pandemia do novo Coronavírus Covid-19 é seu efeito deletério sobre a
economia, atingindo indistintamente grandes empresas e trabalhadores. Com
relação às pessoas jurídicas, o Judiciário tem nos últimos dias enfrentado
inúmeros pedidos de liminares em processos onde são apresentadas ao magistrado
informações sobre a saúde financeira de empresas para comprovar a inviabilidade
em conciliar o pagamento de tributos, como IRPJ, CSLL, PIS, COFINS, IPTU, ISS,
ITBI etc, com a manutenção dos postos de trabalho, porque esse período de
anormalidade representa, para a grande maioria dos negócios, despesas fixas e
constantes de um lado e abrupta e acentuada diminuição da receita do outro.
Como bem destacou o Juiz da 21ª Vara
Federal Cível do Distrito Federal, Rolando Valcir Spanholo, em decisão do
último dia 26 que deferiu liminar afastando por três meses a incidência de
tributos federais: “Note-se que não se está reconhecendo o direito de a parte
autora se furtar ao pagamento das suas obrigações tributárias (que continuarão
incólumes, segundo a legislação de regência). O que se está reconhecendo é a
possibilidade (precária e temporária) dela priorizar o uso da sua (atualmente) reduzida
capacidade financeira (decorrente de ato da própria Administração - FATO DO
PRÍNCIPE) na manutenção dos postos de trabalho de seus colaboradores (pagamento
de salários etc.) e do custeio mínimo da sua atividade existencial em detrimento
do imediato recolhimento das exações tributárias descritas na exordial, sem que
isso lhe acarrete as punições reservadas aos contribuintes que, em situação de
normalidade, deixam de cumprir a legislação de regência.” Da mesma forma o juiz
da 1ª Vara Federal de Novo Hamburgo/RS, Guilherme Gehlen Walcher, que em
decisão do dia 30, argumentando que “não se trata de concessão de uma moratória
de índole judiciária, mas de uma moratória em conformidade a atos já exarados
pelos Poderes Legislativo e Executivo”, pois normas locais obrigam à
interrupção das atividades, “suprimido seu caixa em razão do obrigatório
fechamento de seus estabelecimentos, fundado, repita-se, em atos oficiais que
declararam o estado de calamidade pública”, determinou o “diferimento do prazo
de vencimento de tributos federais devidos”. Há, entretanto, decisões em
sentido contrário, negando a liminar.
Pessoas físicas também podem socorrer-se
do Judiciário. Principalmente porque há um dispositivo expresso no Código de
Defesa do Consumidor, art. 6º, V, que permite revisão contratual quando um fato
superveniente, isto é, inesperado e imprevisto, tornar a obrigação
excessivamente onerosa. E a pandemia constitui fato inimaginado, de modo que o
consumidor tem sua remuneração reduzida e as faturas e prestações anteriormente
assumidas já não cabem mais no seu orçamento. Nessa situação, em que a receita
diminui e as despesas não, sem qualquer culpa do consumidor, é possível
pleitear em liminar uma ordem para que esses valores sejam exigíveis apenas
depois de terminado o pesadelo e sem interrupção do serviço. Tenho certeza de
que em breve a Defensoria Pública ou outras instituições que defendam o
interesse de consumidores proponham ações coletivas com esse objetivo.
Vladimir Polízio Júnior, 49 anos, é
jornalista, advogado, mestre em Direito Processual Constitucional e doutor em Direito
pela Universidad Nacional de Lomas de Zamora, Argentina, e pós-doutor em
Cidadania e Direitos Humanos pelo Ius Gentium Conimbrigae da Universidade de
Coimbra, Portugal. Autor, dentre outros, de Novo Código Florestal, pela ed.
Rideel, e Lei de Acesso à Informação, pela ed. Juruá. Contato:
polizio@polizio.com.br
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