MUNICÍPIOS INCOMPETENTES
Duas decisões preferidas pela ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal-STF, publicadas na quarta-feira, dia 13, reiteram o entendimento já consolidado de que os entes federativos (União, Estados e Municípios) têm várias atribuições concorrentes entre si, mas com relação à autorização para a reabertura do comércio, e consequente abrandamento das recomendações de isolamento social imprescindíveis para o controle da pandemia do Covid-19, devem prevalecer as restrições estaduais.
O município de Parnaíba/PI, inconformado com liminar
proferida em Ação Civil Pública pelo magistrado local, que proibiu, “por prazo
indeterminado”, a edição de qualquer norma que proporcionasse o abrandamento
das restrições impostas pelo governo estadual, recorreu para o STF (Recl.
40.130), alegando “invasão e supressão da competência municipal para regular a
matéria”. Já Limeira/SP, inconformada com deliberação do Tribunal de Justiça de
São Paulo, que manteve liminar igualmente deferida em Ação Civil Pública por
juiz da comarca, não só afastando qualquer norma local de abrandamento mas
determinando que fossem cumpridas as determinações restritivas do decreto
estadual, também recorreu (Recl. 40.336), aduzindo “manifesta invasão e supressão
da competência municipal para regular a matéria”.
Para a ministra, a autonomia municipal para regulamentar
assuntos de interesse local, como funcionamento de comércio, serviços etc, tem
seu alcance limitado diante da excepcionalidade gerada pela eclosão da pandemia
do coronavírus.
Nesse contexto, com relação ao pedido de Parnaíba/PI,
destacou que “o caráter prematuro do retorno às atividades comerciais sem
observância de quaisquer medidas concomitantes de saúde, à luz (i) dos
princípios da precaução e da prevenção, (ii) das recomendações da Organização
Mundial de Saúde e (iii) dos pareceres das sociedades médicas no combate à disseminação
comunitária da Covid-19, bem como em razão (iv) da ausência de leitos em
hospital no Município”, justificando a manutenção da restrição. Na decisão
sobre a reclamação de Limeira/SP, a ministra explicou que a restrição à
circulação de pessoas “deve ser mantida, à luz (i) da ausência de comprovação
da necessidade premente de adoção de medidas diversas daquelas determinadas
pelo Decreto Estadual mencionado, inexistindo perigo de lesão grave e de
difícil reparação e (ii) do risco reverso no caso dos autos, que militaria em
favor da saúde pública, acaso houvesse eventual permissão de funcionamento de
atividades não essenciais”.
Escorreito o entendimento dos tribunais. Quando dois ou mais
direitos fundamentais se contrapõem, é preciso identificar, no caso concreto,
qual deve prevalecer. E
em tempos de pandemia, a garantia do direito à vida, com a inexorável adoção de
medidas que corroborem para cessar, ou ao menos amainar, a propagação do vírus,
sobrepõe-se a qualquer outro direito igualmente fundamental.
Vladimir Polízio Júnior, 49 anos, é jornalista, advogado, mestre em Direito Processual Constitucional e doutor em Direito pela Universidad Nacional de Lomas de Zamora, Argentina, e pós-doutor em Cidadania e Direitos Humanos pelo Ius Gentium Conimbrigae da Universidade de Coimbra, Portugal. Autor, dentre outros, de Novo Código Florestal, pela ed. Rideel, e Lei de Acesso à Informação, pela ed. Juruá. Contato: polizio@polizio.com.br.
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